domingo, 19 de maio de 2013

Quanto vale uma amizade?


Quanto vale as horas de sorrisos e lágrimas juntos? E os dias passados entre brincadeiras e discussões tolas? Foi o que Fabrício se perguntou aquela manhã, sentado com uma revista na mão à espera de uma resposta que mudaria sua vida.

Na noite anterior, ele e Bruno tinham tido uma briga ridícula sobre uma garota que ambos estavam afim: Bruno queria algo sério, sentia que poderia ter um relacionamento forte e Fabrício, bom, Fabrício era o pegador do bairro, garotas eram apenas deliciosos troféus. Eles haviam discutido porque disputavam a mesma menina. Nenhum dos dois sabia o que aconteceria naquela madrugada.


As 3h da manhã o celular de Fabrício tocou. Injuriado por ser acordado e ainda mais chateado por ver de quem era a chamada, simplesmente ignorou a ligação de Bruno. Mas três chamadas insistentes e Fabrício atendeu com a costumeira grosseria arrogante: O que foi, cara! Pow meu, quero dormir, tu já viu que horas são?!

Do outro lado, um soluço e uma frase: Estou morrendo cara, vem aqui, não consigo levantar. O mundo tah girando e tow sangrando por tudo quanto é canto. Me ajuda, man. Tu sabe que não ia te ligar se não tivesse precisando.

Chateado, achando que era alguma armação de Bruno, Fabrício demorou a sair de casa. Resmungando, se vestiu e dirigiu o mais devagar que pode. Quando chegou ao prédio do amigo, estranhou que seu apartamento fosse o único com as luzes acessas, afinal, Bruno dormia cedo e reclamava de qualquer claridade no quarto.

Subiu pelo elevador. O décimo andar estava morbidamente silencioso e um frio percorreu a coluna de Fabrício. O apartamento 310 estava numa calmaria espantosa. A porta estava entreaberta e Fabrício entrou sem bater. O que viu marcaria sua vida para sempre: sangue, sangue em todo lugar. Móveis, cozinha, chão, indo em direção ao banheiro. Lá dentro, um Bruno pálido com sangue saindo pelo nariz e sabe-se lá por onde mais.

- Man, o que foi isso? Pirou, foi? Nem sabia que tu era chegado em pó?

Sorrindo, apesar da dor, Bruno disse: e não sou, cara. Aconteceu do nada, tava jantando e meu nariz começou a sangrar. Cuspi sangue na pia e corri pro banheiro. Nada estanca essa porcaria. Tudo dói, bicho. Me ajuda!

Apesar de tudo, ele sorria. Fabrício carregou o amigo até o carro e, mesmo sabendo que era perigoso, preferiu não chamar a ambulância. Sabia que chegaria mais rápido ao hospital.

Agora, sentado naquela sala asséptica, branca, com um vaso de flor, apenas pra deixar o ambiente mais melancólico, pensava: discutir por causa de uma mina, realmente valia a pena? Bicho, ele é meu amigo de infância e por causa de mim ele poderia ter morrido sangrando. Cara, uma mina num vale isso!

Continha as lágrimas de medo, quando a enfermeira anunciou que o amigo o chamava. Ao entrar no quarto do hospital, viu a cena que nunca queria ter visto. Bruno estava ligado a aparelhos. Uma bolsa de sangue pingava lentamente o líquido vermelho que garantia o pulsar esforçoso de seu coração. Máquinas apitavam medindo os sinais vitais do rapaz, e, apesar disso, ele sorria.

Fabrício ficou estático, besta ao olhar  a cena. Bruno ria: Eu sabia que tu ia ficar assim, por isso não disse nada. Mas, cara, como esse troço é rápido. Man, se tu quiser, pode ficar com Melina, eu vou morrer mesmo. Tenho leucemia, bicho, mas vamos fingir que foi só uma overdose...rsrsrs

Fabrício continuou em choque. Andou até a cama e abraçou Bruno, um abraço desajeitado, e perguntou o que poderia fazer. Conversou com os médicos e começou uma campanha de doação de sangue. Não só para Bruno, mas por todos que precisassem. Quanto vale uma amizade? Brigas bestas quase me fizeram perder meu irmão. Sim, ele é meu irmão!

OBSO texto foi escrito por mim e é proibido seu uso ou cópia integral, ou de fragmentos, sem a autorização da autora. O mesmo vale para todo e qualquer conteúdo deste blog que seja de minha autoria. Sua cópia ou uso sem autorização é qualificado como plágio, sendo configurado como crime previsto no Código Penal. O infrator está sujeito as punições previstas no Art. 184 do Código Penal - Decreto Lei 2848/40

Kamila Mendes

3 comentários:

Contos da Rosa disse...

Muito bom. Fiquei curiosa pra saber o que tinha acontecido com o amigo e nem imaginava esse final.

bjs

Rafa S.R. disse...

Mana, você tem o dom! Sério, a cada linha me surpreendo mais..
Lindo, lindooooo... E com uma mensagem maravilhosa! Este texto me lembrou 'A Culpa é das Estrelas'...
Enfim, às vezes penso que você deveria juntar todos estas suas obras e publicar um livro.. rsrs
Sdd ♥
Bjk, Rafa.

Patrícia Pinna disse...

Bom dia, Kamila. Parabéns pelo texto. Realmente muito emocionante,
Eu não esperava esse final, estava achando que Fabrício nem iria socorrer o amigo.
De qualquer modo, brigas na maioria das vezes são tão idiotas, que causamos tanto estrago dos quais nos arrependemos depois, só que não tem mais volta.
A alma de Bruno era uma alma iluminada e os bons, como dizia Renato Russo "morrem jovens."
Texto maravilhoso!
Que tenhamos a consciência de agirmos com mais docilidade porque não sabemos o que de ruim poderá acontecer no próximo segundo.
Beijos na alma e paz!